domingo, 23 de março de 2014

Chuva e Palavras




Palavras presas na garganta...
E misturavam lágrimas à chuva.

O asfalto derretiam suas esperanças
em passos tão largos, tão duros,
quanto os próprios sentimentos que julgava.
- Já a alma remoía vontades reprimidas
dos verbos nunca conjugados a quem deveria...

Eram amargas as gotas que caiam...
Molhavam o corpo, abraçava os desejos.
E Sonhava entre toques imaginários...
Fazia promessas em pura loucura
e jurava ser tudo a quem, ali, não ouvia!

Palavras presas na garganta...
Queria os braços de quem no momento não podia,
e que em outros acalantava suaves versos
de escrita e cantos como quem nina,
ou provocava com olhares semi puros e lascivos.

Eram amargas as lágrimas que caiam...
E por um relance via sombras que dançavam
entre cigarros e cafés, desejos e estados,
zombando de encontros e ansiando por outros
em segredo de uma frase ainda não dita.

Lúcio Vérnon


quinta-feira, 13 de março de 2014

Memórias e Fantasmas




Sussurros e névoas...
Silhuetas dançam na brisa
e procuram o caminho
pelos olhos Castanhos que ainda olham...

São soleiras de expressões antigas,
de mãos que percorrem os traços
acariciando as tais cicatrizes
e as rosas enrubescidas das costas...

Ouriçam-se os pêlos,
suam sonoramente
e desmantelam-se em puro silêncio
de um momento tão carne...

... Quanto os pedaços de alma
espalhadas, perdidas pela sala
e pelos versos Boêmios
de um tempo não vivente.

Sussurros e névoas...
Esvaem-se pelos cabelos vermelhos
e janelas de grades firmes,
entre o sol e o anoitecer

De um corpo ainda tão sonhado
com suas possíveis imperfeições
e histórias arranhadas por outras mãos,
mas ainda é predominantemente marcada

Pelo ardor da pele áspera na memória
e momentos que ecoam e assombram
a antiga casa de paredes amarelas
e que há um tempo já não os recebem.

Lúcio Vérnon



sexta-feira, 7 de março de 2014

Vazio




Vazio...
Como quase estava acostumando, como mantra, sua mente repetia esse sentimento. As estrelas já haviam se deitado há algumas horas e na sala descansavam garrafas de vinhos baratos, iluminados palidamente pelo sol nublado de luz semi cinza. Ainda rolava na cama com uma preguiça matinal de quem há pouco passou a noite com a falta de coragem para dizer o que talvez não devesse, sufocando-se em palavras engasgadas e nunca pronunciadas às pessoas certas.

Seu olhar viajava por entre as paredes e janela do quarto, voltava no tempo, e quase sem querer, como uma rima de poetas pós-modernos, tropeçou na vontade de braços alegóricos de um passado que ainda teima em não continuar calado e esquecido. Gradativamente o peito apertava, como num lance de desejo de sumir daquele corpo e ir para outro que tivesse um pouco mais de sorte, fazendo-o lembrar de cada mulher que, recentemente, entrara pela porta da sala e ao contrário do que queriam ver, encontrava um homem de corpo imperfeito, barba por fazer, mente evasiva, olhar distante e coração como quase já estava acostumando... Vazio.

E tal sentimento não amenizava, não importando as companhias, que diariamente, quase que como um rito de passagem de noite, acompanhava em caminhada por entre as os prédios da cidade, como quem vende o próprio interesse da vida e corpo, para passar algum momento sendo apenas autêntico em si. Se sentia, como já dito, vazio de algo que não se preenche tão facilmente e que tampouco é encontrado nos entrelaços em lençóis semi sujos de corpos de outrora e cheiros já evaporados pelo tempo que insiste em passar tão rapidamente quanto é possível voar.

A música no quarto ainda tocava em francês repetidamente, um único trecho. Sua vontade era de palavras tão meramente rotas, quanto o sorriso amarelo e espírito cansado, sem brilho, como se pode imaginar entre a razão e os sentimentos. Em sua visão ressaltava a imagem virtual e inebriante daquela quem mais desejava e que mesmo por míseros segundos, fazia sonhar em novos planos, ainda que em brincadeiras. Mas “a vida é o que acontece enquanto fazemos planos”... E o sentimento voltava a se repetir logo em seguida.

- Vazio... No mais amplo significado da palavra...

Os olhos pesavam em rubor de um dia mal dormido e das letras desgastadas em palavras sempre repetidas nos versos tão pobres quanto às rimas dos poetas pós-modernos. Parecia marionete de seu próprio ser, sem vida, vontade, e para variar, apenas funcionava no modo automático de sorriso no rosto e atividades mecânicas da labuta diária. Sentia-se, talvez, um romântico fora de época, apesar do comportamento torpe, e suas lembranças caminhavam num trajeto tão repleto de curvas como as do corpo da mulher que, em conversava sobre problemas e relacionamentos, pedia opiniões deitada no sofá e fazia transcender - inesperadamente - algo que de alguma forma, ela ou aquele momento, parecia preencher um espaço escavado pela vontade de apagar as memórias que um dia fora apenas presentes, não no sentido de tempo, mas que, agora, corrompia as vontades e dividia seu olhar entre o hoje e o nunca mais.

Lúcio Vérnon